“Todos os cogumelos são comestíveis, alguns apenas uma vez!” – Isto é já uma tautologia, ou não tivesse eu uma Quase Pós-graduação em Cogumelologia.
Digo “quase” porque sei tudo sobre os cogumelos que nascem lá na terrinha, em Trás-os-Montes, já destas modernices que se vendem agora em sacos XPTO, que basta juntar água e tal, não sei identificar uma única variedade.
Ao belo exemplar que vêem na foto, nós chamamos de “Roca”, é comestível e é um inquilino que descobri hoje no quintal dos meus pais. Deve comer-se quando ainda tem o formato de uma roca, sem estar aberto como este. Confesso que nunca provei esta variedade, por culpa da minha mãe, que sempre disse que não eram do seu agrado e nunca os cozinhou. Em pequenos apanhávamos imensas rocas e oferecíamo-las a uma vizinha, a Ti Júlia, que acho que as abria, grelhava e comia regadas com azeite.
Desde muito pequenos, começámos a acompanhar os nossos pais nas tarefas da agricultura e, nesta época das castanhas, era quando começava a surgir toda a raça de cogumelos. Na altura, enquanto os meus pais e avós apanhavam as castanhas, nós entretíamo-nos a abrir os ouriços verdes, com as castanhas ainda com a casca branca, para as pelar e rilhar (roer, em Trás-os-Montes, é coisa só dos ratos!). Rilhávamos tantas, que apanhávamos grandes dores de barriga e ouvíamos sempre o mesmo sermão:
– “Quem rilha muitas castanhas cruas, ganha piolhos!” – Tanto eu como o meu irmão tínhamos uma trunfa tal, que nunca piolho algum lá conseguiu habitar, por isso, nunca conseguimos confirmar se esse dizer popular era ou não verdade.
Na época das castanhas encontrar um Níscaro no souto era um triunfo. É um cogumelo grande, algo disforme, castanho por cima, amarelado debaixo da aba. Dizia a minha mãe (“que já diziam os antigos”):
– “Comer um estufado de níscaros é melhor que comer vitela!” –, que esta carne noutras épocas era só digna dos ricos.
Ao domingo, quando viajávamos de regresso a Chaves, lembro-me de ver rapazes à beira da estrada a tentar vender Níscaros. Enfiavam-nos em hastes de giesta, como se fosse um grande colar.
Na altura, eu e o meu irmão andávamos no souto sempre de pauzinho na mão para esgravatar junto de pequenas erupções na terra, na expectativa de nos sair um Níscaro. Ora, para maior desconsolo nosso, o cogumelo que mais predominava em todos os soutos era mesmo o “Arrebenta- Bois”. Era um lindo exemplar vermelho com umas pintas brancas mas, como podem depreender pelo seu nome e pelo tamanho dos bois, o dito deveria ser, no mínimo, “bastante indigesto”!
Havia sempre Arrebenta-bois por toda a parte e era nosso hábito dar pontapés a todos eles, hábito que era partilhado por muita gente, pois era comum verem-se grandes chacinas destes cogumelos quando atravessávamos os soutos a pé, em direcção aos nossos.
Depois da época das castanhas, também se organizavam aos domingos, uns passeios até aos pinhais da zona. Procuravam-se as “Pinheiras” (em Chaves, chamam-lhe “Sanchas”), uns cogumelos achatados de cor alaranjada que nasciam debaixo da agulheta dos pinheiros. Na mesma altura, também se descobriam os “Tortulhos”, mais altos e de cor amarela, mas menos comuns na nossa aldeia. Eram tardes muito bem passadas. Eu confesso que gostava mais de os apanhar que comer, havia até despiques para ver quem apanhava mais!
Lembro-me também das “Repolgas”, uma espécie de cogumelo que crescia agarrada aos troncos dos castanheiros mais velhos. Nunca cheguei a provar, mas lembro-me do meu avô aparecer com uma repolga enorme em casa, com o ar mais triunfante do mundo.
Vá, e que me lembre agora, acho que na lista só me falta o “Mija-Cão”. Cogumelo franzino que nasce em todo o lado e não serve para nada, nem sei mesmo se é indigesto ou não. Quando era pequena achava mesmo que nasciam no sítio onde os cães se lembravam dar uma mijadela. Depois comecei a estranhar quando vi “Mija-Cões” (o plural é mesmo assim!) a nascer em vasos interiores lá de casa… Percebi mais tarde que o nome não podia caracterizar melhor este cogumelo, afinal os cães marcam terreno em todo o lado!
E por aí, alguém conhece algum dos cogumelos que referi? Sei que os nomes variam de região para região, mas se calhar muitos de vocês têm histórias semelhantes para contar.
A Roca
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