“Vou contar-vos a história da minha ida à Guerra dos Rótulos do Verão de 2019“.
Eu trabalhava numa fábrica de compotas, e, um dia sem querer, parti um frasco e despediram-me. Fui então lá para casa sentar-me numa cadeira que nós lá temos para quando somos despedidos. Estava-me a baloiçar, quando entrou o meu tio Gustavo com o jornal que trazia o anúncio da guerra,
“Precisa-se de Soldado que rotule depressa!”,
e diz a minha tia,
“Porque é que tu não respondes a esse anúncio?”,
e diz a minha mãe,
“Isso, isso o que era preciso era comprar-lhe um cavalo!”,
e diz a minha tia,
“Mas eles na guerra dão cavalos”
e diz a mãe,
“Pois, a minha filha vai agora para a guerra montar num cavalo que os outros já montaram, sei lá quem é que já montou naqueles cavalos!”.
Fomos à feira de gado, mas não vendiam cavalos sozinhos, só com as carroças e com as moscas, e a minha mãe disse,
“A minha filha não vai agora para a guerra encher a guerra de moscas… A minha filha, vai a pé mas vai limpa”.
Fomos para casa, e a minha mãe preparou-me umas papas de sarrabulho para o caminho, tomei um uber e fui para a guerra. Cheguei à guerra eram sete horas da manhã, estava esta ainda fechada. Estava também uma mulherzinha a vender castanhas à porta da guerra e eu perguntei,
“Minha senhora, faz favor? Diga-me, aqui é a guerra de 2019?”
E a senhora disse-me,
“Não! É mais acima! Aqui é a guerra de 2017”
Repliquei um,
“Muito obrigada”
Subi dois anos. Cheguei lá cima, e estavam já a abrir as portas onduladas da guerra, eram já nove e tal, e o sentinela perguntou-me se eu vinha ao anúncio, e eu, disse que sim, e perguntou ele,
“E rotulas depressa?”
E eu disse,
“Por enquanto ainda rotulo assim-assim… preciso de treino.”
Respondeu-me,
“Então anda ao capitão.”
Fomos ao capitão, e o capitão perguntou-me se eu trazia a pistola de cola quente ao que eu disse,
“Não, pensei que a ferramenta davam cá vocês. O que eu trago é uma recarga, que um vizinho meu guardou como recordação da guerra dos cem anos”
E diz o tenente,
“Como é que você rotula só com uma recarga?”
E eu expliquei,
“Disparo a pistola de cola quente e depois, vou lá a correr buscar a recarga”,
Aí diz o capitão,
“E a guerra vai parar de dois em dois minutos por sua causa!?.”
Diz o sargento,
“Olha, ata-se com uma guita e depois puxa-se a guita!”
E diz o capitão,
“Pois, depois parte-se a guita perde-se a recarga, perde-se a guita. Que prejuízo não é?”
Bem, fizeram uma conferência e deram-me seis recargas, mandaram-me depois rotular. Estava então eu, a rotular, muito quentinha, quando veio o capitão e mandou-me ir vestir de espia. Deram-me um vestido de orgândicos com uns laços cor-de-rosa na cabeça e mandaram-me de espia. Cheguei à guerra do inimigo, bati à porta e o sentinela espreitou pela frincha e perguntou,
“Quem é?”
E eu,
“Sou a Maria Albertina”, malandrice!
Ele disse,
“O que é que queres?”
E eu disse,
“Eu venho cá buscar os planos da pólvora”
E ele disse,
“Trabalhas de espia há muito tempo?”
E eu disse,
“Trabalho desde as 11!”
Respondeu-me,
“Não levas os planos da pólvora, não levas os planos da pólvora, não levas os planos da pólvora”
Eu não achei graça àquilo, e fui fazer queixa ao capitão dele. O capitão dele disse-me,
“Deixa lá que ele é burro, almoça cá ca gente!”
Bem, almocei no inimigo. Comemos uma cabeça de pescada muita grande e voltei para a minha guerra. Estava a contar isto ao meu capitão, quando entra um soldado a correr,
“Meu capitão dá licença?”
Perguntou,
“O que é?”
Disse o Soldado,
“Fiz um prisioneiro!”
O Capitão surpreendido,
“Onde é que ele está?”
Respondeu-lhe,
“Não quis vir.”
Na guerra há prisioneiros teimosos, a gente puxa, puxa e eles não vêm. Feitios não é?
Aí o meu capitão disse,
“Já que eles não dão os planos da pólvora vai lá buscar o avião”
Como a gente se dava muito bem com o inimigo, nós tínhamos um avião que dava para todos, não era? Eles bombardeavam às Segundas, Quartas e Sextas, e a gente bombardeava às Terças, Quintas e Sábados, e lá íamos morrendo. Eu cheguei lá e bati a porta. Diz-me o capitão,
“Então o que é?”
Disse-lhe,
“Eu venho cá buscar o avião!”
E diz o capitão,
“Não levas o avião, que estamos a adaptar uma torneira para andar a jacto”
Eu não vi torneira nenhuma e voltei outra vez para a minha guerra. Quando cheguei à minha guerra, estava o meu capitão encostado à porta da guerra e disse-me,
“Olha, a guerra acabou!”
Eu, surpreendida,
“Acabouu??”
Disse-me o meu capitão,
“Acabou. Olha que veio cá o fiscal e não tínhamos licença de porte de armas.”